2009-10-01

Líder ou Ditador?


Ainda bem que há ainda gente inteligente na imprensa brasileira. Abaixo um artigo de Augusto Nunes, que escreve na Veja, sobre a peculiar forma dos jornais denominarem ditadores sangrentos: "Líder"... Excelente

Líder é o codinome dos ditadores
Por Augusto Nunes

Entusiasmados com as cenas de abertura do pastelão cucaracha produzido por Hugo Chávez, protagonizado por Manuel Zelaya e encenado num estúdio do Itamaraty em Tegucigalpa, os editores da seção internacional da Folha e do Estadão inventaram o jornalismo de altíssima definição e precisão duvidosa. Zelaya, por exemplo, virou ”presidente deposto”, ”presidente democraticamente eleito” ou “presidente constitucional”. Roberto Micheletti, transferido da presidência do Congresso para a chefia do governo por determinação constitucional, foi rebaixado a “presidente golpista” ou ”presidente de facto” (com c, de conspiração).

Se ninguém mais é apenas chefe de governo, chefe de Estado ou presidente, que tal estender ao resto do mundo os qualificativos que iluminam a crise em Honduras? Pelas normas que têm orientado a cobertura, Mahmoud Ahmadinejad, por exemplo, deve ser apresentado como “presidente eleito sob suspeita de fraude”. E o cartão de visitas de Hugo Chávez tem de identificá-lo como ”presidente ex-golpista”.

A varredura das ambiguidades e dos eufemismos exige a imediata demissão de todos os “líderes”. Líder todo chefe político é. Se estiver na oposição, continua líder. Muda de nome ao instalar-se na chefia do governo. Se chegou ao poder pelo voto, é ”presidente constitucional”. Se contornou o caminho das urnas e assumiu o comando a bordo de um golpe militar, uma safadeza civil ou um movimento revolucionário, é ditador. Não pode fantasiar-se sequer de ”presidente golpista”, “presidente inconstitucional”, ”presidente autoritário”. E fica terminantemente proibido o uso do disfarce de líder.

O líbio Muammar Khadafi foi líder só até o golpe vitorioso. Há 40 anos é ditador. Fidel Castro foi líder até 1° de janeiro de 1959. Proibiu-se de ser presidente ao implantar a ditadura comunista. Tornou-se ditador. Como Fidel por quase 50 anos, o caçula octogenário continua aparecendo nos jornais com o crachá de “líder”, ou com a carteirinha de “presidente”. Os jornalistas fazem de conta que é verdade.

Como todos os tiranos, ambos serão sempre ditadores aos olhos dos homens sensatos. Onde combatentes das redações enxergam líderes continuarão a existir assassinos da liberdade, da democracia e de gente.


2 comentários:

Anônimo disse...

Caro Zappi,
Perspicaz e contundente (como sempre) essa análise do Augusto Nunes. O que está por trás é a enorme inércia bovina da maioria da opinião pública (ricos ou pobres) aqui no berço esplêndido.
Abraços
Claudio Janowitzer
Rio de Janeiro - RJ

PS.: Aqui no Rio foi decretado feriado amanhã (2-10 - sexta-feira) para que a população possa torcer para que a cidade seja escolhida sede das Olimpíadas de 2016. Faz parte do mesmo quadro.

Zappi disse...

Olá Claudio,

Sim, a "torcida" funcionou. Agora vai começar o festival de propinas a agentes públicos. O Diogo Mainardi já começou a descrever a maracutaia.

Um abração