Estávamos naquele momento do jantar em que já havíamos terminado o prato principal. O salmão com molho de maracujá estava divino, muito bem acompanhado com um risoto de espinafre. Acho que o toque mágico foi dado por um excelente Chardonnay chileno. Eu olhava os copos de cristal ainda contendo o líquido um pouco dourado e os belos pratos sobre a toalha rendada, assim como o arranjo de flores pequenino ao lado de cada prato. Ao fundo ouvia-se uma música sutil. Devia ser uma serenata de Mozart.
Tive sorte. Eu estava sentado em frente à Ana. Bonita morena, carioca, sabia se arrumar muito bem. Era uma verdadeira artista. Nessa noite estava usando um colar com figas, muitas figas de pedra coloridas no decote. Os homens passavam-lhe perto e diziam: "Bonitas figas, Aninha!" ao que ela respondia com um sorriso de desmanchar a alma.
Alguém começou a contar piadas de loira. Em certo momento a Ana diz:
"Eu tenho uma! Eu sei uma! Bom, na verdade não é de loira... deixa eu ver... acho que não faz diferença... não, não faz diferença mesmo."
Perguntaram-lhe: "É de loira ou não é?" ao que respondeu: "Não é mas vou fazer com que seja..." Todos os olhos se voltaram para ela. Eu não precisava nem virar o rosto, ela estava aí mesmo, pertinho, na minha frente. Ela começa, minuciosa:
"Foi em um edifício de oito andares, em Copacabana, um apartamento por andar. Era um prédio pequeno, mas muito bem cuidado. O Zelador, seu José, tinha trabalhado ali por vinte e cinco anos e estava a ponto de se aposentar. Todos gostavam muito dele, ele era um amor... bom, todos menos um, né? O morador do primeiro andar, que também era o síndico do edifício, detestava o seu José. Odiava ele mesmo... Fora esse, todos gostavam muito dele. Paravam para bater papo, seu José era muito inteligente e atencioso, amigo mesmo."
Eu me perguntava onde estava a piada de loira, mas só olhar para a Ana gesticulando e descrevendo as minúcias já valia a pena. Ela não parecia ter pressa alguma.
"Uma noite, teve uma reunião de condomínio. Um dos moradores sugeriu que o condomínio pagasse algo a mais para seu José, que estava para se aposentar e sempre tinha sido tão bom funcionário. Imediatamente o síndico pediu a palavra para se opor. Disse que não havia nenhum motivo para pagar nada a mais, a rescisão já seria suficiente. Na verdade o síndico estava furioso. Não podia nem ouvir falar de seu José, de tanta raiva que tinha dele. O outro morador insistiu, houve um bate-boca na reunião e no fim ficou decidido que cada um dava o que quisesse para o zelador. Ficou decidido que o seu José passaria em cada apartamento para se despedir e receber um presentinho de cada um. O síndico não gostou do resultado. Saiu da reunião praguejando."
Eu me perguntava se a Ana estava era caçoando da gente. Ela continuava, entusiasmada, mantendo a atenção de todos. A maior parte dos que estavam na mesa queria era um pretexto para continuar olhando para ela...
"Seu José ficou sabendo do resultado, e ficou preocupado. Sabia que o síndico o detestava, e estava pensando se devia ou não comparecer ao apartamento do primeiro andar. Ele estava certo de que o ódio do síndico era total, ainda que não soubesse a razão para tanta raiva. Enquanto pensava, subiu ao elevador, e se encontrou com a mulher do síndico, que também gostava do seu José. Ela era muito bonita e..."
"Loira!" - dissemos todos, pensando por que é tão comum calhordas se casarem com mulheres bonitas...
"É. E muito bonita mesmo... Aí o seu José falou pra ela que achava melhor não passar lá no primeiro andar e ela disse para ele não ser bobo, que o marido dela no fundo gostava muito dele também, só que tinha vergonha de expressar seus sentimentos. Disse que ele até tinha separado um presentinho para ele, nada de mais, só para expressar a sua gratidão, que ele podia vir sem problemas. Seu José, que como todo bom zelador também era bem desconfiado, ficou pensativo. Sempre achou que o síndico o detestava. Por via das dúvidas decidiu ir primeiro ao oitavo andar e foi descendo. Em cada apartamento, o seu José recebia alguma coisa, dinheiro, cheques. Teve até um pessoal que chorou, emocionado. "
"Chegou a hora do fatídico primeiro andar. Seu José até pensou em desistir, mas no fim pensou que não tinha mesmo nada a perder. Tocou a campainha. Para sua surpresa atendeu a mulher do síndico vestida em uma camisolinha curtinha de seda, chinelos cor-de-rosa com um pouco de salto..."
Ana descrevia os detalhes com precisão. Já estávamos enxergando a loira...
"E pegou na mão dele e disse para ele ficar tranquilo, e levou-o para o quarto. Seu José não podia acreditar no que estava acontecendo, mas se deixou levar. Na verdade nunca tinha se sentido tão feliz como nesse momento em toda a sua vida. A moça foi um encanto com ele."
"Depois de transar seu José já se preparava para ir embora pois não esperava ganhar mais nada na vida. A loira disse para ele esperar um pouco, que tinha uma outra surpresa, e pegou na mão dele e o levou para a cozinha. Lá sentou-o à mesa muito bem posta, com queijinhos, frutas, um café, tudo muito arrumado. Seu José estava boquiaberto e comeu, feliz da vida. Uma coisa o intrigou enquanto comia. Do lado do seu prato havia uma moedinha de vinte centavos. Perguntou para a moça o que era essa moedinha."
"Esta moeda? É que meu marido disse pra mim: 'Você fode ele e dá só vinte centavos.' Agora, o lanchinho... foi idéia minha!"
Todos riam histericamente. Aninha tinha se superado realmente. Notei entretanto que uma pessoa não ria, o marido de Ana, sentado a seu lado. Ele parecia meio chocado, meio boquiaberto... Comecei a me lembrar... não é que eles moravam em um prédio em Copacabana?
"Foi em um edifício de oito andares, em Copacabana, um apartamento por andar. Era um prédio pequeno, mas muito bem cuidado. O Zelador, seu José, tinha trabalhado ali por vinte e cinco anos e estava a ponto de se aposentar. Todos gostavam muito dele, ele era um amor... bom, todos menos um, né? O morador do primeiro andar, que também era o síndico do edifício, detestava o seu José. Odiava ele mesmo... Fora esse, todos gostavam muito dele. Paravam para bater papo, seu José era muito inteligente e atencioso, amigo mesmo."
Eu me perguntava onde estava a piada de loira, mas só olhar para a Ana gesticulando e descrevendo as minúcias já valia a pena. Ela não parecia ter pressa alguma.
"Uma noite, teve uma reunião de condomínio. Um dos moradores sugeriu que o condomínio pagasse algo a mais para seu José, que estava para se aposentar e sempre tinha sido tão bom funcionário. Imediatamente o síndico pediu a palavra para se opor. Disse que não havia nenhum motivo para pagar nada a mais, a rescisão já seria suficiente. Na verdade o síndico estava furioso. Não podia nem ouvir falar de seu José, de tanta raiva que tinha dele. O outro morador insistiu, houve um bate-boca na reunião e no fim ficou decidido que cada um dava o que quisesse para o zelador. Ficou decidido que o seu José passaria em cada apartamento para se despedir e receber um presentinho de cada um. O síndico não gostou do resultado. Saiu da reunião praguejando."
Eu me perguntava se a Ana estava era caçoando da gente. Ela continuava, entusiasmada, mantendo a atenção de todos. A maior parte dos que estavam na mesa queria era um pretexto para continuar olhando para ela...
"Seu José ficou sabendo do resultado, e ficou preocupado. Sabia que o síndico o detestava, e estava pensando se devia ou não comparecer ao apartamento do primeiro andar. Ele estava certo de que o ódio do síndico era total, ainda que não soubesse a razão para tanta raiva. Enquanto pensava, subiu ao elevador, e se encontrou com a mulher do síndico, que também gostava do seu José. Ela era muito bonita e..."
"Loira!" - dissemos todos, pensando por que é tão comum calhordas se casarem com mulheres bonitas...
"É. E muito bonita mesmo... Aí o seu José falou pra ela que achava melhor não passar lá no primeiro andar e ela disse para ele não ser bobo, que o marido dela no fundo gostava muito dele também, só que tinha vergonha de expressar seus sentimentos. Disse que ele até tinha separado um presentinho para ele, nada de mais, só para expressar a sua gratidão, que ele podia vir sem problemas. Seu José, que como todo bom zelador também era bem desconfiado, ficou pensativo. Sempre achou que o síndico o detestava. Por via das dúvidas decidiu ir primeiro ao oitavo andar e foi descendo. Em cada apartamento, o seu José recebia alguma coisa, dinheiro, cheques. Teve até um pessoal que chorou, emocionado. "
"Chegou a hora do fatídico primeiro andar. Seu José até pensou em desistir, mas no fim pensou que não tinha mesmo nada a perder. Tocou a campainha. Para sua surpresa atendeu a mulher do síndico vestida em uma camisolinha curtinha de seda, chinelos cor-de-rosa com um pouco de salto..."
Ana descrevia os detalhes com precisão. Já estávamos enxergando a loira...
"E pegou na mão dele e disse para ele ficar tranquilo, e levou-o para o quarto. Seu José não podia acreditar no que estava acontecendo, mas se deixou levar. Na verdade nunca tinha se sentido tão feliz como nesse momento em toda a sua vida. A moça foi um encanto com ele."
"Depois de transar seu José já se preparava para ir embora pois não esperava ganhar mais nada na vida. A loira disse para ele esperar um pouco, que tinha uma outra surpresa, e pegou na mão dele e o levou para a cozinha. Lá sentou-o à mesa muito bem posta, com queijinhos, frutas, um café, tudo muito arrumado. Seu José estava boquiaberto e comeu, feliz da vida. Uma coisa o intrigou enquanto comia. Do lado do seu prato havia uma moedinha de vinte centavos. Perguntou para a moça o que era essa moedinha."
"Esta moeda? É que meu marido disse pra mim: 'Você fode ele e dá só vinte centavos.' Agora, o lanchinho... foi idéia minha!"
Todos riam histericamente. Aninha tinha se superado realmente. Notei entretanto que uma pessoa não ria, o marido de Ana, sentado a seu lado. Ele parecia meio chocado, meio boquiaberto... Comecei a me lembrar... não é que eles moravam em um prédio em Copacabana?
3 comentários:
Hmmm, vou pedir pra Mary tingir o cabelo. Eu também moro em prédio...
Não precisa... lembre-se que a original não era loira.
Salve Paolo !
A piada eu já conhecia e provavelmente contada por vc... mas da maneira como está descrita o sabor permanece o mesmo. Ainda mais que o final dá realmente um toque a mais ! A condução em tom leve e descontraído faz com que visualizemos as situações e os personagens. Abraços !
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