2006-04-30

Uma folha em branco

Olhou novamente para a folha. Seus olhos, cansados, batalhavam com as letras que teimavam em se embaralhar, ali mesmo, na sua frente. A velha sensação incômoda tinha voltado, o coração já estava a bater mais rápido. Pensa momentaneamente que deveria consultar o oculista, os óculos que estava usando não pareciam mais ajudar. Faz uma pausa. Tira os óculos e esfrega os olhos. Sabia que estava se enganando, sabia que o problema não estava nos óculos. O problema era a própria página, havia demasiados parágrafos, demasiadas linhas e demasiadas palavras. Pensa que não haveria problema. Mandaria resumir. Sim, fazer um sumário bem curto para que ele pudesse ler, assimilar. Ele era inteligente. O problema é que não tinha tido oportunidade. Isso mesmo, não tinha tido a chance de ir a uma escola decente, ler livros... A sensação desconfortável, entretanto, não desaparecia. Sempre acontecia a mesma coisa. Cada vez que em sua vida tentou ler um artigo em uma revista ou jornal, tinha essa reação ansiosa. O esforço era muito grande, sua mente ficava em branco. Lutava para entender cada palavra. O rapaz ao lado não teria dificuldade em ler a página, resumi-la para ele. Tinha tido sorte. Tinha estudado. O que não conseguiu foi reprimir o seu ódio ao vê-lo ler e, tranquilamente, em segundos, resumir a página à metade de seu tamanho original. "Mais não dá, perderia muito conteúdo." disse, com a calma de quem está sendo limpidamente honesto. O que será que lhe causava mais ódio, a forma cândida com que falava ou a facilidade em ler aquela página e reescrevê-la em dois minutos? A sua calma honesta? Ele não tinha tido oportunidades, por esse motivo não pôde ser honesto como o rapaz tinha sempre sido. Tinha que se concentrar em outra coisa. Ficar com ódio do seu auxiliar não o ajudaria em nada. Tinha um país para administrar. Quase duzentos milhões de pessoas estavam esperando dele uma iniciativa, uma decisão acertada. Tinha que ler aquele resumo de um resumo das manchetes de primeira página dos jornais. Precisava no mínimo entender o que estava acontecendo, o que se dizia por aí. Com o novo resumo nas mãos, a ansiedade aumenta. Desiste. O ódio toma conta dele novamente. Imagina uma frase, uma frase que dirá logo mais para uma platéia de milhares de pessoas, que será transcrita em todos os jornais... como poderia começar? "Nunca antes neste país..." Sim, perfeito! Só assim o seu ódio seria mitigado. Aproveitaria para caçoar dos que tinham estudado. Bastava jogar na cara deles, desses desgraçados que leriam com facilidade o jornal no dia seguinte, mostrar-lhes como ele, somente ele podia entender a sensação, a sensação de impotência de segurar uma página, uma folha de papel, que poderia ter estado em branco. Uma folha escrita, que para ele era uma folha suja com garranchos feios e ininteligíveis. Só ele sabia como se apoderar dessa sensação de todos os que já a tinham sentido, voltá-la a seu favor. Isso ele sabia muito bem. Estava decidido. É o que faria hoje.















5 comentários:

Anônimo disse...

Nossa Zappi, o cara faz você ficar realmente raivoso!
Mas ele agora está provando um pouco do próprio veneno: você viu que o Evo Morales, aquele índio que se tornou presidente da Bolívia, expatriou a Petrobrás de lá? Agora ela está "nacionalizada", o que quer dizer que nós perdemos o investimento que fizemos. Isso aconteceu ontem. E ele que tratava o Evo de "meu irmão"...

Zappi disse...

Raivoso eu? Nem tanto. Estou é enxergando melhor, vendo esse ignorante desde a Austrália. Não acredito que ele é simplesmente inimputável por estupidez crônica. O lugar dele é na cadeia, e só isso me tranquilizaria. O mal que esse cara e sua corja estão fazendo ao Brasil não se mede em bilhões de dólares: estão destruindo milhões de vidas humanas.

Eu tenho é muita sorte.

Até

Orlando Tambosi disse...

Excelente, Paulo.

Vou fazer um link para o teu blog.

E, olha, de longe a gente vê as coisas melhor mesmo!

Abração, Tambosi

Anônimo disse...

Olha, Zappi, Noço Guia não merece texto dessa qualidade. Da próxima vez, coloque muitos palavrões, use o rés do chão como medida. A não ser que você não se importe com o fato de que ele nunca o entenderá. Acho que é isso. Você já desistiu do omi, né? Bom, entre os letrados é uma maneira cândida e poética de tratar o instintivo e animalesco que habita a criatura.

Anônimo disse...

Oi,

O cara não merece textos de qualidade, só que este texto não é para ele ler. É para que as pessoas entendam melhor como funciona a cabeça dele. Se a gente começa a baixar o nível, aí sim que o Lula leva vantagem. Ele está perfeitamente à vontade no universo simples e bruto da baixaria. Já percebeu como os petistas tem medo do Fernando Henrique? É porque ele jamais frequenta o baixíssimo nível dos amigos do presidente. Um messias culto é a única arma possível contra um demoniozinho degenerado.