2006-03-30

Não à baixaria

Aurelio, um colega, disse que todos percebem a situação terrível que o Brasil está vivendo. Talvez seja certo. Entretanto todos fazem o possível para fazer parecer que não percebem. Um sistema de defesa? Talvez.

Essa forma de se defender, ignorando tudo à sua volta, é a principal causa dos problemas do Brasil. Cada um que inicia um debate ou uma discussão é massacrado com argumentos do tipo "Que chato". Claro que isso não é argumento: é só uma forma de manifestar a própria incapacidade de debater ou de discutir de forma elevada. Se não se começa discutindo de forma racional, possíveis soluções jamais chegam. Aliás, vocês acham que elas vão chegar do Alckmin ou do Lula, caso for re-eleito? Sim, meus caros. Esperem as soluções virem de cima. Vão esperar sentados.

Outra coisa que me choca é que a baixaria é considerada algo bonitinho. Engraçado isso. Por que será? Olhem à sua volta. Vocês não acham que esse comportamento estimula mais baixaria? Sabem onde termina isso? Em um poço bem fundo. Em um assassinato motivado por uma disputa por ponto de venda de Yakult. Sim é verdade, eu vi isso acontecer. Foi um dos eventos que me ajudaram a decidir sair daí. Não é o cúmulo do baixo nível? Acho que ainda é possível descer mais baixo.

Pior que a baixaria, que o pessoal usa indiscriminadamente para adquirir popularidade, é o ataque contínuo à capacidade intelectual ou artística. Nunca vi, em todas as minhas andanças, um lugar tão hostil à arte como o Brasil. Perguntem para quem trabalha com isso, se conhecerem alguém. O povo brasileiro também é hostil à inteligência, esforço, pesquisa, desenvolvimento. Há um desrespeito enorme, ridicularização até, a tudo que se refere a ciência e arte. Não é só por causa das boas condições no estrangeiro que os cérebros fogem. É por causa da perseguição interna. Por causa do ódio gerado pela inveja dos medíocres. Esse é o motivo mais forte. Só para dar um exemplo, há um pianista fantástico chamado Ricardo Castro. Baiano. Vocês sabem onde ele mora agora? Na Suiça. Claro, não há condição nenhuma no Brasil.

Sei que não é todo mundo que age assim e não pensem que estou acusando ninguém. Pensem entretanto em quantas vezes alguém de valor se afastou de vocês silenciosamente. Já se perguntaram por que? Ninguém que usa a cabeça gosta de baixaria. Eles são obrigados a suportar quietos, pois são minoria absoluta.

Aliás fica um conselho: tentem evitar. Sim, evitem a baixaria. Sei que é doloroso, sei que os que estão acostumados vão sofrer um pouco. Verão entretanto que algo vai melhorar. Perceberão que a qualidade das pessoas à sua volta vai aumentar. E não é mágica não. A baixaria não requer intelecto. Mesmo aos quarenta e tantos anos de vocês, mesmo quem está com os neurônios enferrujados por tão pouco esforço mental, mesmo assim é possível reverter o quadro. O ser humano é incrívelmente flexível e adaptável. Verão como um esforcinho de nada como esse gera um resultado fantástico. É como se, do nada, de graça, uma nova vida surgisse. Por acaso é possível uma recompensa maior que essa?

Na semana passada vi algo que me impressionou muito. Nunca havia ido a um laboratório bioquímico de pesquisa antes. Neste eles trabalhavam com células tronco humanas. A pesquisadora, trêmula de emoção, coloca algo no microscópio. Eu vejo como células não-diferenciadas se convertem em neurônios humanos, com longas terminações. É a semente de uma pesquisa que poderá devolver os movimentos aos paralíticos, por exemplo. E a faísca de algo que gerará frutos incríveis. Pena que esse tipo de pesquisa seja proibida aí.

Gosto de pensar que um dia nascerá um Leonardo da Vinci no agreste nordestino. Não hoje. Um dia. Hoje nascem muitos, mas eles são massacrados desde a mais tenra idade. Não pela fome. Não pela seca. Pela ignorância e intolerância dos que vivem a seu redor. Pela falta de estímulo. Afinal ser melhor é ruim. Discutir é errado. Pensar, intolerável. Mas um dia acontecerá, e esse nordestino do agreste será conhecido como um dos maiores gênios da humanidade, como Newton, Galileu e Einstein. Não sejam vocês a destruí-lo. Façam o possível para que esse dia chegue logo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Só resta agradecer pela "dica".Pensar, e não desestimular que os outros pensem.Um conselho de tanta valia e vindo de tão longe.Por aqui há quase imposições para qe ninguem pense.Só siga a trilha como gado.