Sempre lhe acontecia a mesma coisa. Cada vez que Fernando resolvia confiar em algum brasileiro que encontrava, acabava ficando com razões de sobra de se arrepender. Tinha acontecido em situações diversas, com assuntos de pequena importância. Uma vez foi a daquela carioca que o convenceu a pedir o prato mais caro no restaurante. Ela mesma tinha pedido, só pelo preço... afinal a companhia aérea reembolsaria. Como nenhum dos dois entendeu o menu, não dava para saber que estavam pedindo camarões gigantes com molho de anis e creme. Parecia camarão com pasta de dentes.
Ela sabia, entretanto. Sabia que tinha detestado. Como tinha se ferrado, a única maneira que enxergava para tirar a forra era passando adiante... e encontrou um idiota, ali mesmo, que falava português. O que faz as pessoas procederem desta maneira? Que tipo de solidariedade invertida era essa?
No Brasil isso se chama "espírito de porco". É visto como uma brincadeira que rende boas risadas depois: "Aí apareceram aqueles trouxas e eu os convenci a pedir a mesma caca... Ha ha ha!" Faz parte da síndrome do esperto crônico: afundei, mas me sinto melhor se conseguir arrastar alguém para o fundo comigo.
Fernando sempre acabava pensando que não tinha importância, afinal. Era só um prato em um restaurante, qual o problema? Ele via também uma certa graça em sua própria natureza crédula.
Desta vez era diferente, entretanto. A situação era muito mais séria. Era a diferença entre conseguir se estabelecer com família e tudo em um país novo, ou ter que voltar para casa, com o rabo entre as pernas.
Fernando queria se mudar para a Austrália. Lá por acaso encontrou um rapaz que tinha estudado na mesma faculdade, no Brasil, vejam só que coisa boa! Conversando, o rapaz, que vou chamar de Jorge, para não dar nomes aos bois, lhe disse:
"Imigrar é muito fácil: basta esperar até o fim do curso e dar entrada nos papéis deste jeito aqui e pronto! Eu já consegui, não tem nenhum problema. Vai ser fácil para você também. Ainda mais que somos da mesma faculdade, he he he, vai ser baba!"
Fernando relaxou um pouco. Afinal não precisava fazer nada até que se terminasse o curso. Isso era bom, poderia concentrar-se em estudar somente. Os meses passavam rápido e um dia, conversando com um argentino, amigo de Jorge, comentou como iria conseguir os papéis de residência.
"Ele te disse o quê?!?!?!" - perguntou o argentino, indignado. - "Isso é um absurdo! Jorge não conseguiu a residência por que não aplicou a tempo e você vai pelo mesmo caminho!"
O argentino explicou para o Fernando qual era o procedimento mais adequado e contou em detalhes qual a verdadeira situação de Jorge. Não havia dúvidas, Jorge havia mentido descaradamente e sem motivo aparente. A única conseqüência que a mentira de Jorge teria era a de dificultar ou até mesmo impedir Fernando de conseguir residência. Nisso é que dá confiar em brasileiros... Jorge entretanto poderia ter sido mais decente, afinal tinha cursado a mesma faculdade de Fernando. Isso não tinha nenhum valor para ele?
Subitamente Fernando encontrou-se em uma situação difícil. Tinha menos de um mês para dar entrada em todos os papéis. Certificados, exames, traduções, tudo ao mesmo tempo. Quando checava o que era necessário, descobriu que teria que fazer mais um teste de Inglês. Apesar de ter um certificado equivalente, o governo Australiano exigia outro teste.
Faltavam 15 dias para o prazo fatídico. Em toda a cidade, as salas de exame estavam cheias. Não poderia fazer o teste e não poderia dar entrada nos papéis no prazo correto... "Maldita burocracia..." pensou "... teria entretanto dado tempo se o Jorge não tivesse contado aquela balela, que raiva."
Começou a ligar para todos os lugares da Austrália onde o teste era oferecido. Os Australianos adoram secretárias eletrônicas, e Fernando ia deixando recados em todas elas. Alguém vai me responder. À medida que as respostas chegavam, mais decepção: não havia vagas disponíveis, tente em outro lugar. Continuou assim até o momento em que recebeu uma misteriosa ligação de Wagga-Wagga. Em seu desespero Fernando ia começar a ligar para centros Internacionais, Singapura, Fiji, não interessava aonde. Já não estava esperando que respondessem de Wagga, afinal que droga de lugar era aquele? A moça foi muito gentil, explicou que tinha vagas para um exame que ocorreria na semana seguinte. Fernando perguntou se ela podia acelerar a entrega dos resultados, e ela disse que não haveria problemas. Mandou um mail com dados de como chegar em Wagga, hotéis, trens, tudo o que Fernando precisaria. Ela tornou a ligar para ter certeza que Fernando tinha recebido tudo direitinho. "Então nos vemos em Wagga" - disse, alegremente.
Continua....
Ela sabia, entretanto. Sabia que tinha detestado. Como tinha se ferrado, a única maneira que enxergava para tirar a forra era passando adiante... e encontrou um idiota, ali mesmo, que falava português. O que faz as pessoas procederem desta maneira? Que tipo de solidariedade invertida era essa?
No Brasil isso se chama "espírito de porco". É visto como uma brincadeira que rende boas risadas depois: "Aí apareceram aqueles trouxas e eu os convenci a pedir a mesma caca... Ha ha ha!" Faz parte da síndrome do esperto crônico: afundei, mas me sinto melhor se conseguir arrastar alguém para o fundo comigo.
Fernando sempre acabava pensando que não tinha importância, afinal. Era só um prato em um restaurante, qual o problema? Ele via também uma certa graça em sua própria natureza crédula.
Desta vez era diferente, entretanto. A situação era muito mais séria. Era a diferença entre conseguir se estabelecer com família e tudo em um país novo, ou ter que voltar para casa, com o rabo entre as pernas.
Fernando queria se mudar para a Austrália. Lá por acaso encontrou um rapaz que tinha estudado na mesma faculdade, no Brasil, vejam só que coisa boa! Conversando, o rapaz, que vou chamar de Jorge, para não dar nomes aos bois, lhe disse:
"Imigrar é muito fácil: basta esperar até o fim do curso e dar entrada nos papéis deste jeito aqui e pronto! Eu já consegui, não tem nenhum problema. Vai ser fácil para você também. Ainda mais que somos da mesma faculdade, he he he, vai ser baba!"
Fernando relaxou um pouco. Afinal não precisava fazer nada até que se terminasse o curso. Isso era bom, poderia concentrar-se em estudar somente. Os meses passavam rápido e um dia, conversando com um argentino, amigo de Jorge, comentou como iria conseguir os papéis de residência.
"Ele te disse o quê?!?!?!" - perguntou o argentino, indignado. - "Isso é um absurdo! Jorge não conseguiu a residência por que não aplicou a tempo e você vai pelo mesmo caminho!"
O argentino explicou para o Fernando qual era o procedimento mais adequado e contou em detalhes qual a verdadeira situação de Jorge. Não havia dúvidas, Jorge havia mentido descaradamente e sem motivo aparente. A única conseqüência que a mentira de Jorge teria era a de dificultar ou até mesmo impedir Fernando de conseguir residência. Nisso é que dá confiar em brasileiros... Jorge entretanto poderia ter sido mais decente, afinal tinha cursado a mesma faculdade de Fernando. Isso não tinha nenhum valor para ele?
Subitamente Fernando encontrou-se em uma situação difícil. Tinha menos de um mês para dar entrada em todos os papéis. Certificados, exames, traduções, tudo ao mesmo tempo. Quando checava o que era necessário, descobriu que teria que fazer mais um teste de Inglês. Apesar de ter um certificado equivalente, o governo Australiano exigia outro teste.
Faltavam 15 dias para o prazo fatídico. Em toda a cidade, as salas de exame estavam cheias. Não poderia fazer o teste e não poderia dar entrada nos papéis no prazo correto... "Maldita burocracia..." pensou "... teria entretanto dado tempo se o Jorge não tivesse contado aquela balela, que raiva."
Começou a ligar para todos os lugares da Austrália onde o teste era oferecido. Os Australianos adoram secretárias eletrônicas, e Fernando ia deixando recados em todas elas. Alguém vai me responder. À medida que as respostas chegavam, mais decepção: não havia vagas disponíveis, tente em outro lugar. Continuou assim até o momento em que recebeu uma misteriosa ligação de Wagga-Wagga. Em seu desespero Fernando ia começar a ligar para centros Internacionais, Singapura, Fiji, não interessava aonde. Já não estava esperando que respondessem de Wagga, afinal que droga de lugar era aquele? A moça foi muito gentil, explicou que tinha vagas para um exame que ocorreria na semana seguinte. Fernando perguntou se ela podia acelerar a entrega dos resultados, e ela disse que não haveria problemas. Mandou um mail com dados de como chegar em Wagga, hotéis, trens, tudo o que Fernando precisaria. Ela tornou a ligar para ter certeza que Fernando tinha recebido tudo direitinho. "Então nos vemos em Wagga" - disse, alegremente.
Continua....
3 comentários:
Cher Zappi,
Lendo os posts:Wagga-Wagga,A ciganinha,Ventos da Tasmânia, fiquei completamente,sensibilizada com a beleza do seu for interior!
Você é um grande ROMANTICO com sensibilidade profunda que as vezes me da impresão que você é melancolico,as vezes penso que existe em você uma forte delicadeza quase feminina ao mesmo tempo que alguns traços de alguem que continua como uma criança pura etc.Gosto muito da maneira que você escreve e me pergunto se você ja escreveu algum livro de romance mas não romace choromingados hahahaha acho que você nem vai ler este comentario sendo assim vou parando aqui nas 03h aqui, não repare meus erros.Abrs
Obrigado Julia, muita gentileza a sua!
Zappi,
não esperava que você tivese tempo pra ler comment.antigo!
OBRIGADOOOOOOOOOOOO
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